
Aquela situação que passara era visível em seu carrancudo rosto quando chegou à fábrica para fazer a tão sonhada ficha.
Não era o emprego de seus sonhos, no entanto para quem estava anos desempregado e o namoro dependia do sucesso de conseguir o emprego, aquela colocação naquela cervejaria era o último fôlego de dignidade, de continuar sendo uma pessoa normal e não um solteirão perdedor convicto, o que ficou para trás.
Amadeu sentia em seu íntimo que alguma coisa daria errado naquela empreitada, mas não dava ouvido para aquela voz pessimista que gritava em seu ouvido, porque não poderia nem pensar em perder aquela oportunidade; seu futuro estava todo ali, inclusive o seu namoro com Janete: que já não mais o suportava o vê como o que não toma decisão alguma, principalmente a de se casar com ela, namoravam há cinco anos e nem noivos eram ainda.
Janete era uma moça comum que procurava a felicidade e que a via na estabilidade, sonhava em casar com Amadeu. Mas aquela altura já percebera que havia errado na pessoa e muito feio: Amadeu além de não ter iniciativa, ela acha que ele não tinha sorte, era um “pé frio”, o que ele não gostava muito de ouvir, principalmente ela.
Ele dava tudo para provar ao contrário à sua namorada e agora tinha diante de si a oportunidade, apesar de ser um emprego que não o estimulava muito.
Aconteceu justamente que Amadeu receava, ele foi descartado e o pior foi que ocorreu quando pensava que estava tudo certo: foi aprovado em todas as etapas da seleção, mas foi reprovado no exame auricular.
Quando recebeu a desagradável notícia, pensou que iria perder os sentidos, sentiu-se humilhado por ser o único a ser reprovado do grupo e por a notícia ter sido dada por uma funcionária muito bonita. Aliás, todas as funcionárias do setor de seleção eram lindas, uma tinha até o mesmo nome de sua namorada, o que ele pensava que iria trazer sorte, mas foi ao contrário.
Amadeu estava completamente perdido, era o fim. Não havia como mais protelar iria perder Janete, era uma questão de tempo.
Caminhando à saída da firma tudo isso e muito mais lhe vinha à cabeça, chegando ficar tudo embaralhado, começava a pensar absurdo. Os pensamentos viam ao turbilhão e Amadeu não sabia como lidar com eles.
Era muito difícil pensar tudo de uma só vez: o namoro, as pressões em casa, da sociedade e tinha ainda a questão pessoal, a auto-estima que estava para sempre comprometida.
Amadeu sentiu que não agüentaria mais um baque, havia suportado muitos dissabores. Semelhante ocorrera anos atrás: passara por todas as fases da seleção para ser reprovado no exame médico.
O caminho até a portaria (saída) lhe parecia muito longo pelos pensamentos que lhe passaram à cabeça e curto para suas pernas. Não havia o que fazer era voltar para casa sem esperança alguma, apesar do consolo dado pela funcionária que ele seria chamado quando aparecesse uma vaga em que o problema de audição era irrelevante. Agora era retornar para vida de desempregado e apática de sempre.
Amadeu na verdade não sabia o que fazer e nem no que pensar. Teria que omitir para Janete novamente, sempre escondera dela suas desventuras profissionais, o que ela reclamava muito, dizendo que ele não a deixava participar de sua vida, inclusive aquela que acontecera anos atrás, quando tentara entrar na mesma firma que seu irmão trabalhava e tivera a mesma frustração que estava tendo agora: de ser recusado na última fase da seleção.
Amadeu sempre suspeitara que Janete o comparava ao irmão, melhor queria que ele fosse igual, com a possilibidade de trabalhar na empresa isso poderia tornar possível. Por isso Amadeu não contou à ela, quando tudo deu errado, para poupá-la de uma decepção, mas agora não havia mais jeito, ela se desapontaria e talvez para sempre.
O que Amadeu temia ocorreu: ficou sem emprego e sem Janete. No entanto, querendo ou não tinha uma vida para viver. Ele, na verdade, foi consolado pelos batidos adágios: “O tempo cura tudo.”, “O tempo é senhor da razão.” e “Nada melhor que um dia após outro.”, pois amigos, alguém com quem pudesse desabafar, não tinha. Teve que enfrentar a dor do desprezo de Janete sozinho, sentiu na carne o que é não ser desejado mais.